domingo, 18 de dezembro de 2005

o que lhes ia na alma


As tabernas eram o reino triste dos homens; aí, nas longas noites de Inverno, jogavam eles às cartas ou contavam à escassa luz dos candeeiros, o trocado que lhes sobejava nos bolsos. Pipos garrafas e copos, um balcão corrido, alguns bancos, duas ou três mesas coxas, uma "mercearia" onde se comprava sempre menos o essencial - assim eram as tascas, espaços acanhados, envoltos numa quase ausência de luz que enchia de sombras os recantos e vincava rugas nos rostos.
De quando em vez, no entanto, algum dos presentes sentia-se tocado pelo sortilégio do "fado serrano", e essa espécie de magia comunicava-se rapidamente aos demais. Cantavam então os homens à desgarrada; cantavam o que lhes ia na alma e sorriam, quase esquecidos de que a dor existe.

Dr. Paulo Ramalho, Tempos Difíceis - Tradição e Mudança na Serra do Açor

Sem comentários: