"A noção de absurdo se origina desde a Grécia antiga com os filósofos eleatas. O mais famoso discípulo de Parâmides, Zenão de Eléia (século V a.C), já introduzia o absurdo aparente como princípio de raciocínio filosófico, ao provar matematicamente a impossibilidade do movimento, que seria uma ilusão dos sentidos. Diógenes Laércio identificou em Zenão o criador da dialética, isto é, da lógica entendida como redução ao absurdo. Nota-se nas aporias paradoxais (caminhos sem saída) de Zenão uma redução ao absurdo das teses pitagóricas, que atribuíam ao ponto uma determinada dimensão.
Da parte dos sofistas tais métodos serviam para demonstrar, ironicamente, a falsidade das proposições de um adversário. Estabeleceram-se, assim, na escolástica, dois métodos contestatórios: a probatio per absurdum (prova pelo absurdo) e a reductio ad absurdum (redução ao absurdo). No primeiro se pretendia provar a verdade de uma proposição pela falsidade evidente de sua contraditória (por exemplo o Teorema de Pitágoras); no segundo caso ocorria uma inversão do significado inicial de uma proposição, provando-se a sua falsidade pelo exagero de suas conseqüências até o ridículo (por exemplo a Teoria dos Limites, na matemática). A reductio ad absurdum constituía-se, pois, num método irônico de ridicularizar uma doutrina adversária. Através do uso escolástico o absurdo identificou-se na Antiguidade com o conceito de falso.
Muito antes, entretanto, da escolástica, já é possível reconhecer a origem do moderno conceito de absurdo, identificação com o conceito de não racional, de algo fora dos limites da compreensão racional.
Seguindo vertentes diferentes do intelectualismo dos métodos escolásticos, e até mesmo mais antigas ao mesmo, eram as teses religiosas de Tertuliano (155 d.C.). Ele professava que a fé consiste apenas a crença, sem qualquer necessidade de compreensão racional. Ao ser acusado pelos pagãos de defender dogmas absurdos e contrários à razão, Tertuliano respondeu, em sua obra de De Carne Christi (Sobre a carne de Cristo), com a frase, Credo quia absurdum (Creio porque é absurdo), erroneamente atribuída a santo Agostinho. Alguns dos principais filósofos incorporaram as disposições anti-racionais do Credo quia absurdum, entre eles santo Agostinho, santo Anselmo e são Bernardo de Clairvaux.
A noção do absurdo esteve, assim, latente nas filosofias irracionais ou nas que se recusavam a encontrar uma explicação racional para a existência. Paralelamente a essas filosofias, tal noção encontrava-se também subjacente em muitas expressões artísticas do passado, sobretudo nas manifestações do nonsense, do fantástico, da literatura dos sonhos, do humor negro, etc. O nonsense, o fantástico e o humor negro são conceitos afins ao de absurdo no sentido moderno, mas distintos.
O nonsense seria o disparatado puro e simples, o absolutamente sem sentido, enquanto o absurdo teria sempre um sentido, embora inexplicável e recôndito; o fantástico se situaria numa fronteira indefinida entre a realidade e a irrealidade, ou seria um modo peculiar de ver a existência, através de fantasias individuais, enquanto o sentimento do absurdo estaria ligado ao real em si mesmo, independente das projeções subjetivas (e neste sentido seriam fantásticas as obras de Edgar Allan Poe, E. T. A. Hoffmann e Gérard de Nerval, enquanto modernamente a obra de Franz Kafka se poderia enquadrar na temática do absurdo existencial); e, finalmente, o humor negro (com o jornalista americano Ambrose Bierce) se caracteriza como expressão essencialmente gratuita, enquanto a noção de absurdo estaria comprometida com a busca de significação para o real.
Apesar, entretanto, dessas diferenças, a afinidade de tais manifestações com o tema do absurdo evidenciou-se em vários autores modernos, que utilizaram o nonsense e o fantástico como elementos de uma nova indagação do significado da existência; e até mesmo o humor negro, caracterizado pela gratuidade em autores de um passado recente (os surrealistas, por exemplo, Salvador Dali), revelou-se como algo carregado de novas conotações, nas obras de um Kafka ou de um Samuel Beckett.
Temos no séc. XX muitos escritores que tratam da temática do absurdo. A obra de ficção de Franz Kafka é um excelente exemplo. Em seus romances, a ação dos heróis parece destituída de significação, pois está condicionada a uma potência invisível e imprevisível. Sua obra parece indicar a inutilidade das ações humanas diante de uma lei desconhecida.
A noção do absurdo da existência, subjacente em alguns precursores da filosofia existencial (Sören Kierkegaard, Miguel de Unamuno e outros), tornou-se núcleo básico de algumas expressões filosóficas e artísticas modernas. Os existencialistas rejeitaram as hipóteses metafísicas e teológicas para a explicação da existência e introduziram a noção do fracasso ontológico do homem, cuja vida seria "uma paixão inútil" (Jean-Paul Sartre).
A tese do absurdo existencial foi explicitada por Albert Camus em Le Mythe de Sisyphe, essair sur l’absurde (O Mito de Sísifo, ensaio sobre o absurdo), ensaio em que o personagem mitológico Sísifo encarna a inutilidade do esforço humano. Ao lado da expressão filosófica, a obra ficcional e dramática de Sartre e Camus revelaria também, através de situações típicas, a problematização do absurdo. As mais características, nesse sentido, seriam Le Mur (O Muro), contos de Jean-Paul Sartre em que personagens decidem sobre os seus destinos contra as leis da razão social, Calígula e a La Peste (A Peste), drama e romance de Albert Camus em que os personagens se rebelam contra a própria condição humana, reduzida à sua impotência individual ou coletiva.
Os existencialistas procuraram uma saída para o dilema da condição humana, propondo a escolha lúcida do próprio destino (Sartre) ou a revolta (Camus). Esta saída foi negada pelos representantes do teatro do absurdo, que não admitem sequer a possibilidade de explicação para o real, proclamando a impotência dos atos humanos. Neles, ao sempre realista, o absurdo emerge funcionalmente na própria representação cênica, com a arte de Maurits Cornelis Escher, com a mímica grotesca, o nonsense, o humor negro e as expressões parabólicas."
fonte: M.C. Escher
Da parte dos sofistas tais métodos serviam para demonstrar, ironicamente, a falsidade das proposições de um adversário. Estabeleceram-se, assim, na escolástica, dois métodos contestatórios: a probatio per absurdum (prova pelo absurdo) e a reductio ad absurdum (redução ao absurdo). No primeiro se pretendia provar a verdade de uma proposição pela falsidade evidente de sua contraditória (por exemplo o Teorema de Pitágoras); no segundo caso ocorria uma inversão do significado inicial de uma proposição, provando-se a sua falsidade pelo exagero de suas conseqüências até o ridículo (por exemplo a Teoria dos Limites, na matemática). A reductio ad absurdum constituía-se, pois, num método irônico de ridicularizar uma doutrina adversária. Através do uso escolástico o absurdo identificou-se na Antiguidade com o conceito de falso.
Muito antes, entretanto, da escolástica, já é possível reconhecer a origem do moderno conceito de absurdo, identificação com o conceito de não racional, de algo fora dos limites da compreensão racional.
Seguindo vertentes diferentes do intelectualismo dos métodos escolásticos, e até mesmo mais antigas ao mesmo, eram as teses religiosas de Tertuliano (155 d.C.). Ele professava que a fé consiste apenas a crença, sem qualquer necessidade de compreensão racional. Ao ser acusado pelos pagãos de defender dogmas absurdos e contrários à razão, Tertuliano respondeu, em sua obra de De Carne Christi (Sobre a carne de Cristo), com a frase, Credo quia absurdum (Creio porque é absurdo), erroneamente atribuída a santo Agostinho. Alguns dos principais filósofos incorporaram as disposições anti-racionais do Credo quia absurdum, entre eles santo Agostinho, santo Anselmo e são Bernardo de Clairvaux.
A noção do absurdo esteve, assim, latente nas filosofias irracionais ou nas que se recusavam a encontrar uma explicação racional para a existência. Paralelamente a essas filosofias, tal noção encontrava-se também subjacente em muitas expressões artísticas do passado, sobretudo nas manifestações do nonsense, do fantástico, da literatura dos sonhos, do humor negro, etc. O nonsense, o fantástico e o humor negro são conceitos afins ao de absurdo no sentido moderno, mas distintos.
O nonsense seria o disparatado puro e simples, o absolutamente sem sentido, enquanto o absurdo teria sempre um sentido, embora inexplicável e recôndito; o fantástico se situaria numa fronteira indefinida entre a realidade e a irrealidade, ou seria um modo peculiar de ver a existência, através de fantasias individuais, enquanto o sentimento do absurdo estaria ligado ao real em si mesmo, independente das projeções subjetivas (e neste sentido seriam fantásticas as obras de Edgar Allan Poe, E. T. A. Hoffmann e Gérard de Nerval, enquanto modernamente a obra de Franz Kafka se poderia enquadrar na temática do absurdo existencial); e, finalmente, o humor negro (com o jornalista americano Ambrose Bierce) se caracteriza como expressão essencialmente gratuita, enquanto a noção de absurdo estaria comprometida com a busca de significação para o real.
Apesar, entretanto, dessas diferenças, a afinidade de tais manifestações com o tema do absurdo evidenciou-se em vários autores modernos, que utilizaram o nonsense e o fantástico como elementos de uma nova indagação do significado da existência; e até mesmo o humor negro, caracterizado pela gratuidade em autores de um passado recente (os surrealistas, por exemplo, Salvador Dali), revelou-se como algo carregado de novas conotações, nas obras de um Kafka ou de um Samuel Beckett.
Temos no séc. XX muitos escritores que tratam da temática do absurdo. A obra de ficção de Franz Kafka é um excelente exemplo. Em seus romances, a ação dos heróis parece destituída de significação, pois está condicionada a uma potência invisível e imprevisível. Sua obra parece indicar a inutilidade das ações humanas diante de uma lei desconhecida.
A noção do absurdo da existência, subjacente em alguns precursores da filosofia existencial (Sören Kierkegaard, Miguel de Unamuno e outros), tornou-se núcleo básico de algumas expressões filosóficas e artísticas modernas. Os existencialistas rejeitaram as hipóteses metafísicas e teológicas para a explicação da existência e introduziram a noção do fracasso ontológico do homem, cuja vida seria "uma paixão inútil" (Jean-Paul Sartre).
A tese do absurdo existencial foi explicitada por Albert Camus em Le Mythe de Sisyphe, essair sur l’absurde (O Mito de Sísifo, ensaio sobre o absurdo), ensaio em que o personagem mitológico Sísifo encarna a inutilidade do esforço humano. Ao lado da expressão filosófica, a obra ficcional e dramática de Sartre e Camus revelaria também, através de situações típicas, a problematização do absurdo. As mais características, nesse sentido, seriam Le Mur (O Muro), contos de Jean-Paul Sartre em que personagens decidem sobre os seus destinos contra as leis da razão social, Calígula e a La Peste (A Peste), drama e romance de Albert Camus em que os personagens se rebelam contra a própria condição humana, reduzida à sua impotência individual ou coletiva.
Os existencialistas procuraram uma saída para o dilema da condição humana, propondo a escolha lúcida do próprio destino (Sartre) ou a revolta (Camus). Esta saída foi negada pelos representantes do teatro do absurdo, que não admitem sequer a possibilidade de explicação para o real, proclamando a impotência dos atos humanos. Neles, ao sempre realista, o absurdo emerge funcionalmente na própria representação cênica, com a arte de Maurits Cornelis Escher, com a mímica grotesca, o nonsense, o humor negro e as expressões parabólicas."
fonte: M.C. Escher
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