Exma. Senhora Ministra da Educação
Um dia destes colocaram, no placar da Sala dos Professores, uma lista dos
nossos nomes com a nova posição na Carreira Docente.
Fiquei a saber, Sr.ª Ministra, que para além de um novo escalão que
inventou, sou, ao final de quinze anos de serviço, PROFESSORA.
Sim, a minha nova categoria, professora!
Que Querida! Obrigada!
E o que é que fui até agora?
Quando, no meu quinto ano de escolaridade, comecei a ter Educação Física,
escolhi o meu futuro. Queria ser aquela professora, era aquilo que eu queria
fazer o resto da minha vida. Ensinar a brincar, impor regras com jogos,
fazer entender que quando vestimos o colete da mesma cor lutamos pelos
mesmos objectivos, independentemente de sermos ou não amigos, ciganos,
pretos, más companhias, bons ou maus alunos. Compreender que ganhar ou
perder é secundário desde que nos tenhamos esforçado por dar o nosso melhor.
Aplicar tudo isto na vida quotidiana.
Foi a suar que eu aprendi, tinha a certeza de que era assim que eu queria
ensinar! Era nova, tinha sonhos...
O meu irmão, seis anos mais novo, fez o Mestrado e na folha de
Agradecimentos da sua Tese escreve o facto de ter sido eu a encaminhá-lo
para o ensino da Educação Física. Na altura fiquei orgulhosa! Agora, peço-te
desculpa Mano, como me arrependo de te ter metido nisto, estou envergonhada!
Há catorze anos, enquanto, segundo a Senhora D. Lurdes Rodrigues, ainda não
era professora, participava em visitas de estudo, promovia acampamentos,
fazia questão de ter equipas a treinar aos fins-de-semana, entre muitas
outras coisas. Os alunos respeitavam-me, os meus colegas admiravam-me, os
pais consultavam-me. E eu era feliz. Saia de casa para trabalhar onde
gostava, para fazer o que sempre sonhara, para ensinar como tinha aprendido!
Agora, Sr.ª Ministra, agora que sou PROFESSORA, que sou obrigada a cumprir
35 horas de trabalho, agora que não tenho tempo nem dinheiro para educar os
meus filhos. Agora, porque a Senhora resolveu mudar as regras a meio (Coisa
que não se faz, nem aos alunos crianças!), estou a adaptar-me, não tenho
outro remédio: Entrego os meus filhos a trabalhadores revoltados na
esperança que façam com eles o que eu tento fazer com os deles. Agora que me
intitula professora eu não ensino a lançar ao cesto ou a rematar com
precisão à baliza, não chego, sequer a vestir-lhes os coletes.
Passo aulas inteiras a tentar que formem fila ou uma roda, a ensinar que
enquanto um "burro" mais velho fala os outros devem, pelo menos, nessa
altura, estar calados. Passo o tempo útil de uma aula prática a mandar
deitar as pastilhas elásticas fora (o que não deixa de ser prática) e a
explicar-lhes que quando eu queria dizer deitar fora a pastilha não era para
a cuspirem no chão do Pavilhão. E aqueles que se recusam a deita-la fora
porque ainda não perdeu o sabor? (Coitados, afinal acabaram de gastar o
dinheiro no bar que fica em frente à Escola para tirarem o cheiro do cigarro
que o mesmo bar lhes vendeu e nunca ninguém lhes explicou o perigo que há ao
mascar uma pastilha enquanto praticam exercício físico). E os que não tomam
banho? E os que roubam ou agridem os colegas no balneário?
Falta disciplinar?
Desculpe, não marco!
O aluno faz a asneira, e eu é que sou castigada? Tenho que escrever a
participação ao Director de Turma, tenho que reunir depois das aulas (E quem
fica com os meus filhos?). Já percebeu a burocracia a que nos obriga? Já viu
o tempo que demora a dar o castigo ao aluno? No seu tempo não lhe fez bem o
estalo na hora certa?
Desculpe mas não me parece!
Pois eu agradeço todos os que levei!
Mas isto é apenas um desabafo, gosto de falar, discutir, argumentar com quem
está no terreno e percebe, minimamente do que se fala, o que não é, com toda
a certeza, o seu caso.
Bastava-lhe uma hora com o meu 5ºC. Uma hora! E eu não precisava de ter
escrito tanto! E a minha Ministra (Não votei mas deram-ma. Como a médica de
família ,que detesto, mas que, também, me saiu na rifa e à qual devo estar
agradecida porque há quem nem médico de família tenha - outro assunto)
entendia porque não conseguirei trabalhar até aos 65 anos, porque é injusto
o que ganho e o que congelou, porque pode sair a sexta e até a sétima versão
do ECD que eu nunca fui nem serei tão boa professora como era antes de mo
chamar!
Lamento profundamente a verdade!
Ana Luísa Esperança
PQND da Escola EB 2,3 Dr. Pedro Barbosa
recebido por e-mail
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