A beleza natural da Barragem de Santa Luzia, associado ao sossego da paisagem rural, eram os atractivos utilizados para a promoção de um centro turístico para as Minas da Panasqueira. Com a concretização deste projecto, da responsabilidade de um grupo luso-belga, podia nascer uma nova luz ao fundo do túnel daquela região que estava mergulhada numa crise socioeconómica. Jorge Patrão, actual presidente da RTSE e na altura vereador da Câmara da Covilhã, empenhou-se na divulgação daquele centro turístico que, por enquanto, está longe de vir a ser uma realidade.
Um ano depois da crise nas Minas da Panasqueira, em 1994, uma nova esperança surge para a região. Os jornais noticiavam que estava projectado um centro turístico para rentabilizar as condições naturais de uma vertente da Serra da Estrela ainda por explorar. O anúncio era feito por Jorge Patrão, o actual presidente da RTSE e, na altura, vereador na Câmara da Covilhã. Convicto do sucesso do projecto da responsabilidade de um grupo luso-belga, o autarca não teve mesmo pejo em dizer que este empreendimento ía ser uma «pedrada no charco na realidade socioeconómica que se vive na região».
A ideia deste projecto turístico teria surgido de um empresário português radicado na Bélgica e natural do couto mineiro. Como na altura noticiava o «Público», pretendia-se, assim, rentabilizar as condições naturais de uma vertente da Serra da Estrela, assim como a área envolvente da barragem de Santa Luzia. O grupo pretendia igualmente aproveitar alguns imóveis da Beralt para instalar as infra-estruturas e disponibilizar apartamentos para arrendamento ou venda a famílias que desejem passar férias em Portugal. Na região poderia ainda vir a ser construído um museu das minas. Para o arranque do projecto, foram iniciados contactos com a Beraltin.
Contactado pelo TB, Correia de Sá, administrador da empresa mineira, confirmou que chegaram mesmo a ser vendidas «uma grande parte das casas da Panasqueira, a preços relativamente baixos. As cerca de cinquenta casas não chegaram a atingir a soma de dois mil contos». Algumas chegaram mesmo a ser adquiridas por belgas. Desta forma a Beraltin pretendia colaborar, «na medida do possível, com o desenvolvimento turístico da região».
Os cartazes que na altura foram colocados em vários locais da freguesia, pelo grupo luso-belga, anunciando a venda de uma variedade de casas, era oferecida a «possibilidade de desportos náuticos: barcos de recreio, motonáutica, vela, ski, surf». Como se não bastasse para convencer, era referido que o empreendimento, que «ficaria a 12 quilómetros do rio» e «a 18 quilómetros da Barragem de Santa Luzia.», tinha «todo o esplendor e sossego da paisagem rural». No fundo, este era «o local ideal para as férias merecidas!».
Grupo luso-belga admite não haver «nada de concreto»
Desconhecendo tudo o que se estava a passar, o então presidente da Junta de Freguesia de S. Jorge da Beira, José Alves Pacheco, deslocou-se à Câmara da Covilhã para obter informações detalhadas sobre o complexo turístico divulgado por Jorge Patrão mas pouco mais ficou a saber. O vereador ter-lhe-á mesmo dito que «não estava autorizado a falar desse empreendimento, uma vez que estava no maior sigilo», salientou o autarca no decorrer de uma reunião da Assembleia Municipal da Covilhã, realizada em finais de 1994.
Prosseguindo a sua intervenção, José Alves Pacheco acrescentou que só depois de se dirigir à empresa Beraltin foi finalmente informado do que se estava a passar. Mas as dúvidas persistiram e ainda hoje continua céptico quanto à concretização deste aldeamento turístico.
O TB já conseguiu saber junto da administração da empresa responsável pelo projecto, que «nunca houve qualquer intenção de pôr de lado o presidente da Junta de Freguesia de S. Jorge da Beira». Esse contacto não veio a verificar-se porque, argumenta um dos responsáveis do grupo luso-belga, «as coisas não correram como esperávamos» e, para além disso, «ainda não havia, tal como hoje, nada de concreto quanto ao projecto turístico».
Este viria a ser, aliás, o motivo que levou a empresa «a recusar o pedido de Jorge Patrão para marcar uma conferência de imprensa para divulgar o projecto». Curiosamente, o então vereador da Câmara da Covilhã e actualmente presidente da Região de Turismo da Serra da Estrela, assim não entendeu e decidiu ele anunciar aos quatro ventos a boa nova e, segundo noticiou na altura o Notícias da Covilhã, a assumir mesmo que «o projecto estava com grandes avanços, faltando apenas a assinatura das escrituras».
O que é certo é que, passados quase quatro anos, tudo ainda não passou de meras intenções. Um dos administradores já confirmou ao TB que «neste momento» não vão avançar porque «ainda não conseguiram os apoios necessários para o projecto desejado». Não se poderá, no entanto, falar de desistência. Tanto que, salientou, continuam a promover o projecto «lá fora» e a ser «desenvolvidos alguns contactos para poder avançar».
Em declarações ao TB, Jorge Patrão rejeita que se tenha envolvido em demasia neste «projecto», argumentando que «é preciso não esquecer que se estava a viver uma altura muito difícil naquela região e era preciso dar alguma motivação para o futuro». E como o grupo luso-belga tinha intenção de «promover a venda e a recuperação das casas da aldeia», o recém eleito presidente da RTSE considerou que era necessário «acarinhar aqueles que mostravam vontade em remar contra a maré e promover algum tipo de investimento numa zona que estava totalmente carenciada». Jorge Patrão entendeu também que não devia manter em segredo tudo isto e achou por bem divulgar o projecto que hoje não passa ainda de um «sonho» de alguns.
Diferente sorte para as minas
Diferente futuro parece terem as minas da Panasqueira. Cem anos depois do início da sua laboração, apresentam hoje uma situação, considerada pelo administrador da empresa, Correia de Sá, de «normal». A crise em que esteve envolvida entre 1993 e 1995 parece estar ultrapassada. Emprega actualmente cerca de 250 trabalhadores e todos os meses são extraídos 170 toneladas de concentrado de volfrâmio.
A boa situação da empresa levou já a administração a fazer investimentos, nomeadamente a construção de uma nova lavaria, abertura do terceiro nível de extracção e a construção de um novo poço, garantindo mais dez anos de vida da mina.
Desconhece-se quem terá descoberto as minas da Panasqueira, sabendo-se que há registos de exploração mineira naquela zona durante a ocupação romana. Mas o registo da mina teria sido feita apenas a 15 de Abril de 1886, na Câmara Municipal da Covilhã, por Manuel dos Santos e Boaventura Borrel, que seriam mesmo reconhecidos como tendo sido os descobridores do volfrâmio da Panasqueira. Em 1894, o próprio rei D. Carlos I de Bragança concendia o alvará.
Dezasseis anos depois, a mina viria a ser arrendada a uma empresa inglesa, a Wolfram Mining and Smelting Company, que mais tarde se viria a fundir na Baralt Tin Limited.
Os anos de crise começaram a partir de 1928 e, desde então, as lutas foram-se sucedendo. Até que, em Janeiro de 1993, a empresa paralisa, alegadamente por haver dificuldades no escoamento do produto. Mas, passados dois anos, a exploração volta a estar em expansão. Adiado está a concretização do sonho de um dia surgir ali muito próximo um centro turístico. A continuar assim será mais a juntar-se ao que uma empresa norte-americana projectou, há alguns anos atrás, para a albufeira da Barragem de Santa Luzia. Por agora, aldeamentos, estalagem, restaurantes, campos de ténis, clube náutico, marina... tudo não passou de um «sonho americano».
Gustavo Brás - Terras da Beira
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