Sábado, Novembro 15, 2003
Dias felizes
Que justifica o curso da existência...
Que justifica o facto de continuar a vida até ao fim dos dias?
Que fraude comanda a dúvida da nossa existência?
Restam dúvidas da estrutura existêncial - disse o menino que não percebe o homem, ali, à sua frente.
Cifras e códigos referem (e marcam) o ser humano.
O que me resta desde aquele dia de Agosto ( um poderoso labirinto) que venci.
Na minha frente tenho Margarida que liberta a minha alma.
As maiores palavras, afinal, puxam violentamente a dolorosa recordação.
Essas palavras, profundas, áridas e duras, esmagam as minhas deambulações.
Devo compreender a enorme responsabilidade que está nas minhas mãos: Margarida e Mariana.
Observo-as. Uma aprendizagem.
Pedaços de vida que marcam dias felizes.
# posted by carlos : 15.11.03
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Revendo as minhas primeiras peças
(...) este puro prazer da luta deveria ser examinado. Quando fazia o esquema, apercebi-me desde logo de que era particularmente difícil conduzir e manter uma luta sensata, que, segundo a minha visão de então, seria uma luta que provasse qualquer coisa. Tinha cada vez mais uma peça sobre a dificuldade de conduzir uma tal luta. As personagens principais encontravam este ou aquele meio para alcançarem qualquer coisa a que se pudessem agarrar. Escolhiam, como campo de batalha, a família de um dos lutadores, o seu local de trabalho e por aí fora. Também era "ocupada" a propriedade do outro lutador (e, assim, sem o saber, aproximava-me bastante da verdadeira luta que estava de facto a acontecer e que eu apenas idealizava: a luta de classes). No final a luta acabava por se revelar aos contendores como um mero boxe de sombras; também enquanto inimigos a sua aproximação não era possível. No crepúsculo sobressai uma descoberta: que o prazer da luta no capitalismo tardio já só é uma deformação selvagem do prazer da competição. A dialéctica da peça é puramente idealista.(...)
Bertolt Brecht
# posted by carlos : 15.11.03
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BERTOLT BRECHT
Nasceu em 1898 e morreu em 1956. Afirmou-se como autor dramático nos frenéticos anos 20 e primeiros anos 30 com peças como NA SELVA DAS CIDADES, A ÓPERA DOS TRÊS VINTÉNS; ASCENSÃO E QUEDA DA CIDADE DE MAHAGONNY e A MÃE. Saiu da Alemanha em 1933 com a subida de Hitler ao poder e depois de ter estado na Finlandia e sobretudo na Dinamarca, chegou em 1941 aos Estados Unidos onde iria permanecer até 1947. Foi neste período que escreveu as suas grandes obras da maturidade como GALILEU, MÃE CORAGEM, O CÍRCULO DE GIZ CAUCASIANO e PUNTILA. Pouco depois do seu regresso à Europa, em 1947, fundou o Berliner Ensemble e desde essa altura até à sua morte, dirigiu sobretudo as suas peças ou adaptações de clássicos. As Edições Cotovia estão a preparar a publicação do Teatro de Bertolt Brecht.
# posted by carlos : 15.11.03
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O Amante de Ninguém
O AMANTE DE NINGUÉM de Manuel Wiborg (a partir de Dostoievski)
Um projecto de Manuel Wiborg, Sylvie Rocha, Bruno Bravo (Américo Silva em 1999) e Canal Caveira (REF em 1999)
Direcção Técnica José Rui Silva
Figurinos Rita Lopes Alves
Fotografia Jorge Gonçalves
Produção Helena Bragança Gil e Catarina Saraiva
Estreia: 3 de Outubro de 1998 no Seixal. Reposição em Abril de 1999 nas caves do Liceu Camões.
O texto foi publicado pelas Edições Cotovia, no volume Três Peças Breves.
O texto de O Amante de Ninguém estruturou-se a partir de monólogos das personagens masculinas do Sonho de um Homem Ridículo e da Voz Subterrânea, a que se foram juntando alguns dos diálogos das Noites Brancas. Aquilo que agora aqui está é uma abordagem cénica ao jovem Dostoievski, às suas deambulações - realistas mas também oníricas - pelo labirinto da cidade, aos seus exaltados encontros e recuos, à irremediável solidão das suas personagens. Não se trata aqui de explorar o drama destes homens e mulheres dilacerados perante a incomensurável grandeza da vida, mas apenas indicá-lo, esboçar, apontar. É um espectáculo que tenta recuperar o gesto de quem folheia um livro mais do que aquele de quem nele se perde, noite fora, absorto. Aquilo que aqui se pede ao espectador é o olhar de quem passeia pela cidade velha, usufruindo do tempo dos encontros e da visão das fachadas das casas, da passagem da luz sobre os prédios.
Manuel Wiborg
# posted by carlos : 15.11.03
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Sexta-feira, Novembro 14, 2003
«Os jornalistas»
(...)um desfile de tudo o que não ensinam nos cursos de Jornalismo. E fico assustado. Como temia, é disto que se trata: facções, grupos, detestações, facadas, invejas, conspirações, cabalas, traições, hipocrisias, vaidades, pulhices. Escrevi aqui uma vez que as redacções são uns vespeiros. Quero aqui, solenemente, pedir desculpa às vespas por tão ofensiva comparação.
Dicionário do Diabo um blog de Pedro Mexia
# posted by carlos : 14.11.03
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Porto (o sentido)
(...)o tom estranhamente nórdico, mas também o Porto romântico, dolente de folhas vermelhas nos parques. Ou os cafés, com outro movimento, extinto em Lisboa.(...)
Dicionário do Diabo um blog de Pedro Mexia
# posted by carlos : 14.11.03
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Beira Serra : acessibilidades
"Ante a desorientação patente no planeamento territorial português decidimos, mais uma vez a esmo, tornar ao assunto das acessibilidades da Beira ao Atlântico, lançando sementes que, prevemos, dificilmente florescerão neste interim estival. Ainda assim, o tom é grave.
1. O sistema composto pelas serras da Estrela, Açor e Lousã, contido a noroeste e a sudeste pelos cursos dos rios Mondego e Zêzere, respectivamente, é parte de um Portugal perdido, na iminência de tornar-se pior: decorativo, qualificado de "tipical".
Terra beiroa, constituída de granito e xisto, revestida de giesta e urze, centro e margem do país, carece de uma infra-estrutura aglutinadora, cujo sentido estratégico ultrapasse o mero utilitarismo das acessibilidades.
Entendemos ser prioritário estimular a função social do transporte, invertendo a tendência generalizada para o uso do automóvel, promovendo situações que, sem inibirem a viagem, não desqualifiquem o ambiente (poluição sonora, química e atmosférica, detritos e ocupação desbragada do solo com viadutos e acessos amiúde desproporcionados) e contrariem a sangria - chamam-lhe êxodo - de população rural para as cidades, geralmente para engrossar as desqualificadas, vulgares e humanamente empobrecidas periferias. Urge, pois, estabelecer uma rede que altere a nossa noção dos limites, físicos mas também mentais, e possa redesenhar a estrutura das relações.
Se as novas tecnologias de transporte não recompuserem as assimetrias regionais, e inflectirem os indícios de crise populacional, o que o fará?
2. É evidente que o eixo Guarda - Belmonte - Covilhã - Fundão, acentuado pelo IP2, carece de uma ligação eficaz ao litoral. Porém, num momento em que se dá como adquirido a prossecução das obras do IC7 (6?) até à Beira Interior, infeliz e inexplicavelmente (?) estagnadas pelo caciquismo do Governo anterior em Mouronho, julgo ser oportuno, e nada contraditório, encararmos novo desafio civilizacional: o da ligação ao Atlântico e a Espanha, participando numa rede ferroviária transeuropeia - deficiência que muito nos distingue da Europa próspera e progressiva que considera, desde meados de Oitocentos, a facilidade de circulação de passageiros e mercadorias um bem inestimável.
O referido eixo, deve clarificar-se e assumir o sentido estratégico da expansão a oeste. Esta premissa, exige considerar a linha desde Figueira da Foz, passando por Montemor-O-Velho, Coimbra, Vila Nova de Poiares, Lousã e Góis até Pampilhosa da Serra como o prolongamento natural e estruturante horizontal do Centro.
Só deste modo, poderemos inaugurar um conceito metropolitano, aglutinando as povoações do vale do Zêzere em rede e, a partir do Barco, rumar ao Alto Ceira, facilitando o percurso de 100Km entre Coimbra e Covilhã, acedendo à linha do Norte e aos portos de mar.
3. Assinalava recentemente o Prof. António Brotas (Público.05'ago.p7), a propósito da construção de 7000Km de linhas de alta velocidade com bitola europeia em Espanha, ser urgente um acordo sobre os projectos de interesse comum, a defender nos próximos encontros ibéricos sobre os caminhos-de-ferro. Referia-se à validade e interesse de três projectos em particular: a linha do Porto à Corunha; a linha de Aveiro a Valladolid, por Viseu; e a ligação Lisboa, Badajoz até Madrid. Todos eles passíveis de obtenção de créditos em Bruxelas. Acentuando ainda que, desta forma, assegurando com correcção as ligações ao exterior, resolveremos alguns dos mais prementes problema endógenos.
Este aspecto macroscópico da rede principal interessa-nos, na medida em que recoloca o problema da rede secundária, cuja antecipação deve mobilizar os responsáveis políticos, a fim de que haja as necessárias correspondências regionais dos traçados. Evitando o "déjà vu" da serôdia tentativa de modernização da linha da Beira Baixa, e do lastimável atalho ferroviário entre Covilhã e Guarda. A alternativa de locomoção ferroviária, só não é um sucesso técnico e comercial entre nós porque o anquilosado mapa ferroviário é pouco atractivo, mercê do sarro e excentricidade das estações, do desconforto das composições circulantes e da ineficácia dos serviços de apoio aos passageiros, além da falta de pontualidade e da incompatibilidade de horários com outros meios de transporte.
4. Por ser assunto correlativo, a pretensão de que a ligação viária entre Covilhã e Coimbra seja sob a forma de auto-estrada parece, desde logo, enfermar de alguma megalomania. Ademais de pressupor protelar a obra -devido à implícita necessidade de revisão do traçado do IC7 (6?)- defrontar-se-á com algumas contrariedades difíceis de rebater: acidentadas condições orográficas, aliadas às especificidades do perfil de uma auto-estrada (largura e áreas de servidão, extensão, proporção e espaçamento dos ramais de acesso).
Para os que conhecem os vales do Alva, do Ceira e do Mondego, é óbvio que o impacte ambiental de uma intervenção deste tipo não seria fácil de minimizar, a menos que se optasse por uma intervenção de cariz alpino, com viadutos e túneis, onerosa e apenas justificável para fluxos de tráfego elevados. Acresce que, sendo as auto-estradas espaços de ausência, não respondem às necessidades cívicas de interacção humana nem à escala do entorno e reduzem a eficácia das medidas de restrição à circulação automóvel, que tendem a generalizar-se nos centros urbanos.
Mais sensato será batermo-nos para que o IC7(6?) atravesse, quanto antes, o planalto beirão, se prolongue a partir de Galizes rumo a Pedras Lavradas e daí até ao IP2. Neste último troço exige-se, antes de mais, alto sentido de Estado, para que o seu desenho não dependa, como foi uso na EN230, das habituais trocas de benesses (e de cabritos), antes observe o melhor itinerário.
5. Numa altura em que, inaugurado mais um retalho do IP2, se discute a introdução de portagens em vias sem alternativa capaz, torna-se mais claro para os beirões o encargo real implicado na locomoção rodoviária. É, pois, necessário compreender a relação de complementaridade entre as ligações rodoviária e ferroviária, desenvolvendo medidas que compensem o magnetismo de Lisboa e de Madrid em todos os azimutes.
Quando toda a Europa estabelece e afere planos ferroviários (não só de alta velocidade), construir caminho-de-ferro, dará um sinal ecológico ao povo, será menos oneroso do que a auto-estrada, terá menor impacte paisagístico, minimizará a sobrecarga económica decorrente do uso de automóvel e, decerto, contribuirá para diminuir a taxa de sinistralidade".
(Francisco Paiva / urbi.ubi.pt)
# posted by carlos : 14.11.03
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Quinta-feira, Novembro 13, 2003
Sin contador
"Entre tanto movimiento altruista sugiero uno más. El movimiento de páginas sin contador de visitas. Su lema podría rezar así, “lea cuanto quiera, su visita no servirá para engordar el ego del autor.”
He decidido ingresar en el club"...
Biblioteca de Babel
# posted by carlos : 13.11.03
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Medicina, indústria e turismo
"Ainda é cedo para avaliar o método de ensino da novel Faculdade das Ciências da Saúde da UBI. Com um mês só quase de aulas qualquer tentativa de avaliação seria completamente desprovida de sentido.
Mas o entusiasmo dos novos alunos no primeiro contacto com o Complexo Hospitalar da Cova da Beira diz o suficiente para sermos optimistas em relação aos futuros médicos formados no novo modelo de ensino.
E isto já é um sinal positivo a servir de aviso aos Velhos do Restelo que tudo fizeram para impedir a atribuição à Covilhã desta nova Faculdade. Não que haja no ar qualquer intenção de pequena vingança. Pelo contrário. Os senhores dos lóbis instalados têm já a partir de agora motivos para repensar as suas atitudes na valorização das iniciativas lançadas no Interior.
O tempo na sua inexorável caminhada ditará a justeza da decisão tomada pelo poder político.
A Faculdade das Ciências da Saúde como consolidação da UBI e articulada com outras iniciativas lançadas projecta a Covilhã comum pólo dinamizador do eixo Guarda-Covihã-Castelo Branco.
Não se vejam aqui laivos de qualquer bairrismo barato e, fora de moda, mas tão somente a realidade dos factos sem contestação.
O Parque de Ciência e Tecnologia é uma rampa de lançamento não só na criação de novos empregos mas também no aprofundamento da investigação que pode dar à região um novo elã de carácter industrial.
O Parque Industrial do Tortosendo aparece como uma nova locomotiva na dinamização do tecido empresarial. Trata-se de lançar os alicerces para igualmente fixar licenciados da UBI e garantir, com os pés bem assentes na terra, um futuro consolidado.
A dimensão do novo Parque traduz as ambições que se desejam para a diversificação das novas indústrias.
A revitalização das Termas de Unhais vê finalmente chegada a sua hora. Para além dos tratamentos termais, é um incentivo para passagem de férias e actividades na área do lazer. Conjugadas com a estrada de ligação à Serra da Estrela pela barragem do padre Alfredo, as Termas passam a dispor de um atractivo e belo passeio turístico que pode dar novo alento às Penhas da Saúde e aliciar novos circuitos pela Torre e Manteigas.
Um outro circuito alternativo é seguir pelas Pedras Lavradas a rota do Sobral de São Miguel, Casegas e Paul com visita a lugares típicos e incursão pela rica gastronomia desde os maranhos às trutas.
Quando houver uma ligação condigna do Sobral de São Miguel ou de Casegas a São Jorge da Beira, temos aí paisagens virgens e locais aprazíveis para descansar o espírito e saborear horizontes de sonho.
A partir da UBI, do Parque de Ciência e Tecnologia, do Parque Industrial do Tortosendo e das Termas de Unhais da Serra, a Covilhã como pólo de desenvolvimento dispõe de virtualidades que lhe auguram um futuro promissor. Com médicos a fixarem-se na região o optimismo é regra. Não desanimem os homens a levar a tarefa até ao fim.
Nós, nesta modesta trincheira, nunca daremos tréguas à passividade e à indiferença e estaremos sempre na linha da frente para que a Covilhã ocupe o lugar que lhe compete na dinamização do eixo da Serra na linha de complementaridade. Na exigência da justiça que sabemos nos pertencer e nas razões que, com toda a evidência, nos assistem".
(José Geraldes //urbi.ubi.pt)
# posted by carlos : 13.11.03
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Quarta-feira, Novembro 12, 2003
À sombra do castanheiro
"- Então o Tio Ambrósio, este ano, não vai passar uns dias de férias até às praias do sul? Cá por cima as temperaturas não têm estado nada convidativas para uns mergulhos retemperadores. Até nisto os tempos mudaram...
- Mudaram os tempos e mudaram as vontades, Carlos! Antigamente, por estas alturas, eu quase não era capaz de resistir a um convite, sobretudo do meu afilhado Jacinto, para ir por aí fora, quase sem destino, de aldeia em aldeia, em busca dos costumes das nossas gentes. Era aquilo a que eu chamava encher a alma de portugalidade.
- Eu preferia uns dias descansado, a torrar as costas numa das nossas belas praias, e a regalar-me com um petisco, a meio da tarde, na companhia do meu cunhado Acácio, enquanto a Joana e a irmã Ermelinda passavam em revista, numa daquelas conversas intermináveis, todos os acontecimentos sociais do Cabeço nos últimos tempos.
- Aí tens um dos motivos porque eu costumo dizer que não somos todos iguais. Vocês divertem-se e descansam, em amena cavaqueira, em frente dum copo de cerveja, enquanto as mulheres usam a tesoura social, cortando na vida alheia. Pela minha parte, prefiro sempre um passeio a uma alta montanha, de onde se possa apreciar um panorama que nos encha a alma de coloridos novos, de onde se possa alargar o olhar até ao infinito. Eu não sei, por exemplo, se tu algum dia te deste ao trabalho de subir ao cimo do Colcurinho, de onde se avistam terras de todo o planalto beirão, e uma infinidade de pequenas aldeias semeadas pelas encostas dos montes. É um quadro bonito de se ver!
- Onde eu ainda gostava de voltar era ao Penedo da Torre ou ao Picoto de Cebola. O Tio Ambrósio já lá foi?
- Quando era mais novo e as pernas me deixavam, Carlos! Agora limito-me a visitar os locais onde chega o automóvel. Que eu saiba, ainda não há estrada para o Picoto.
- Só a butes, Tio Ambrósio! O que há é um carreiro, nalguns lados já pouco conhecido por falta de utilizadores. Agora já não há carvoeiros e os pastores já pouco frequentam aquelas paragens. E para o Penedo da Torre ainda é mais difícil. Trata-se dum passeio só acessível a rapaziada de vinte anos e com boa preparação física. Que o diga o meu afilhado Leonardo, que ainda o ano passado me enviou uma bela fotografia com o panorama que dali se pode apreciar, com montes a perderem-se de vista até ao azul do infinito...
- Isso quase pode considerar-se um desporto radical, que já não é bem próprio para homens que precisam de um cajado para auxiliarem as pernas. No entanto, como te disse, há muitos outros lugares onde se pode chegar com maior facilidade, e donde podemos desfrutar de deslumbrantes paisagens, cheias de colorido e de encanto Aqui bem perto tens o alto do Trevim, na serra da Lousã. Ou então a Cruz Alta, na serra Buçaco, ou mesmo a Senhora do Círculo, nos arredores de Condeixa. Vale a pena um passeio a qualquer desses sítios, para respirar um pouco de ar puro e alongar os olhos pela distância, desde o interior das Beiras até ao mar...
- Assim numa escapadela, na companhia do Sanguessuga e do Acácio, todos acompanhados das respectivas famílias, é bem possível que, num domingo destes, ponhamos os pés ao caminho. A Joana maila Ermelinda arranjam uma merenda farta, com pastéis de bacalhau, rissóis de camarão e um arroz à valenciana, e vamos dar ao dente para uma sombra refrescante num desses locais aprazíveis. O problema é o regresso, pois apenas a Ermelinda, entre as mulheres, pode trazer o automóvel.
- Agora, com estas novas leis sobre a ingestão de álcool, os condutores têm que tomar as devidas cautelas. Bebe-se menos, Carlos!
- Que remédio, Tio Ambrósio! Nós temo-nos por cidadãos conscientes! É verdade que, de quando em vez, nos nossos convívios, um ou outro elemento encharca a vela. Mas, em regra, todos os do nosso grupo sabem ocupar o seu lugar.
- Nem outra coisa seria de esperar de pessoas com sólida formação moral. Por isso, façam o favor de aproveitar os domingos para, depois da participação na missa, darem uma volta com as vossas famílias. Mas não se limitem à merenda melhorada. Tenham sempre o objectivo da valorização pessoal. Muitos de nós somos incultos por burrice própria, pois não sabemos aproveitar as ocasiões que se nos oferecem para adquirirmos mais conhecimentos. Uma boa parte dos cabecenses, por exemplo, nunca entraram num museu.
- Isso é verdade, Tio Ambrósio! Mas olhe que as entradas nesses lugares custam sempre mais de quinhentos mil réis por pessoa. Para urna família de cinco ou seis elementos é pesado. A não ser que se troque a merenda por uma visita guiada...
- Tens razão, Carlos! Eu, por vezes, até me esqueço que muitas das nossas famílias vivem com orçamentos apertados...
- E, por isso, resta-nos o gosto da merenda e do convívio com os amigos. Barriga composta e alegria! Contentamo-nos com pouco, não acha?"
(O Amigo do Povo)
# posted by carlos : 12.11.03
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Terça-feira, Novembro 11, 2003
Histórias da História de Ceira
O rio Mondego nasce na Serra da Estrela e parte, serra abaixo, em direcção ao mar. Depois de receber as águas do Dão, serpenteia num vale apertado entre encostas até que, subitamente, no lugar da Portela, está ás portas de Coimbra e aproxima-se, finalmente, da planície. É aqui que recebe as boas-vindas do rio Ceira, descido ao seu encontro desde a Serra de S. Pedro do Açor.
Os dois rios encontram-se onde a ponte de ferro, velha de 125 anos, dá passagem à Estrada da Beira, que de Coimbra vai em direcção á Guarda e à fronteira de Vilar Formoso. Ao lado dessa ponte, uma outra, por onde o comboio se dirige à Lousã.
É um lugar cruzamento de caminhos, quer o que é já desusado - o caminho do rio por onde os barqueiros antigamente transportavam pessoas e mercadorias -, quer os outros, cheios de movimento. Ali mesmo, sobre um morro sobranceiro, foi construída a Escola Básica 2,3 de Ceira. As suas janelas mereceram uma paisagem encantadora. As águas dos dois rios que se encontram, as encostas verdes que lhes ladeiam as margens, o casario das povoações próximas, constituem um cenário que encanta quem o vê. E para esta Escola vêm, todos os dias, os jovens da Vila de Ceira e das povoações que lhe estão ligadas.
As terras junto ao Ceira estiveram desde o séc. VIII, como o resto da região, na posse dos muçulmanos. Durante essa ocupação, os mouros permitiam que a vida decorresse com normalidade em troca do pagamento de contribuições. Depois, com o início da reconquista, a região tornou-se terra de constantes lutas. Nessa altura, entre os séculos IX e XII, quando Coimbra era a cidade cristã mais ao sul, a população destes lugares sofreu as angústias de ser uma terra de fronteira, constantemente sujeita à destruição de colheitas e ao perigo de vida provocado pelas incursões, ora cristãs, ora mouras. Quando D. Afonso Henriques tomou o poder, a linha de defesa da região de Coimbra era constituída pelo largo semicírculo formado pelos castelos de Penacova, Arouce (Lousã), Miranda, Penela, Soure, Montemor e Santa Eulália.
Muitos dos confrontos que nesta época se davam entre cristãos e mouros resultavam de rápidas incursões de inimigos no território, geralmente dirigidas, não à povoação em si, mas aos campos de cultivo e às pastagens e matas, a fim de se apoderarem de alimentos, gado ou lenha. Era arriscado sair para longe da povoação, mas ás vezes tornava-se necessário fazê-lo; quando as populações fronteiriças saíam a cortar lenha e madeira, criava-se um destacamento de gente que os protegesse. Dava-se a esta operação o nome de azaria (de azza = machado); se os mouros os surpreendiam, havia uma luta que tomava o nome de azar.
Para diminuir o perigo, construíam-se ou reaproveitavam-se pequenas fortificações, simples torres, que tinham grande importância porque serviam de atalaias de dia e de escutas durante a noite. Quando se detectava a aproximação do inimigo, faziam-se sinais por meio de almenaras (fumo ou fogo) que avisavam do perigo os vigilantes de outros locais. Então tocava-se a rebate e chamava-se o povo. Esta convocação repentina era conhecida por apelidar a terra; o apelido era a resistência ao ataque dos mouros.
Cercando o vale da foz do Ceira, existiam várias destas pequenas fortificações, não se sabe bem se aproveitadas de época anterior ou se construídas na altura. Resta a memória de duas, uma através do nome da terra, Castelo Viegas, outra ainda visível, embora em ruínas, a torre de Bera.
Porém, a acção sistemática de reconquista levada a cabo por D. Afonso Henriques começa a dar os seus frutos. O castelo de Leiria é construído em 1135, procurando-se assim suster as investidas mouras mais a sul. Miranda vê o seu castelo reconstruído em 1136 e recebe foral, tal como Arouce. Os habitantes da região de Ceira, embora livres de ataques directos, por certo ainda sofriam grandes angústias com as notícias das constantes incursões mouras na região de Ladeia, perto do Rabaçal.
A segurança total só terá vindo com a conquista de Santarém em 1142, quando a terra de ninguém, palco de lutas, desceu para sul do Tejo.
Ceira, senhorio de Mestre Julião Pais
Nesta época, o governo não tinha sede certa e permanente. As frequentes viagens da corte faziam com que o centro da administração fosse a cidade, a vila ou o lugar onde o rei se encontrava. Na sua tarefa de governante, o rei era auxiliado pela Cúria Régia, conselho de grandes do reino que o acompanhavam. Dessa Cúria, além do alferes-mor, do mordomo e de outros, fazia parte o chanceler (cancellarius).
Era a este alto funcionário que estava confiada a guarda do selo real que autenticava todos os documentos régios. Superintendia ao trabalho dos funcionários da chancelaria, tanto dos escrivães, como dos notários; todos os actos régios passavam pelas suas mãos, já que muitas vezes supervisionava a redacção ou redigia ele próprio documentos régios e era quem os autenticava com o selo pendente ou com o signum regis. Além disso, o chanceler era também o chefe da magistratura.
Sucedeu que D. Afonso Henriques, após o desastre de Badajoz em 1169, altura em que partiu uma perna, foi obrigado a uma vida mais sedentária. Nessa altura, estabeleceu-se em Coimbra, cidade a que estava ligado Julião Pais, quer por laços familiares quer pela posse de bens. A partir de 1183, é a este senhor de Ceira que é entregue a chancelaria cuja responsabilidade viria a assumir até 1215, ano da sua morte.
O Infante D. Sancho já participava na maior parte dos actos públicos durante os últimos anos do reinado do seu pai. Mas quando chegou o momento de lhe suceder no trono, a continuidade da administração foi sobretudo assegurada por este célebre chanceler que, em 1185, data da morte de D. Afonso I, exercia o cargo havia dois anos. Gerindo os negócios públicos com grande sabedoria, manteve as funções durante todo o reinado de D. Sancho I e ainda nos primeiros tempos do reinado de D. Afonso II.
O título de Mestre que lhe era atribuído tornou-se um reconhecimento da sua grande sabedoria e dos vastos conhecimentos jurídicos que dele fizeram um dos vultos a cuja acção se deveu a consolidação do reino português.
Deve ter sido esse valor que fez com que D. Afonso Henriques, desejando beneficiar o seu ilustre chanceler, Mestre Julião Pais - um dos homens mais importantes do Portugal de então - tenha justamente escolhido Ceira e o seu termo para constituir o senhorio que lhe concedeu em 1180. Não foi possível, no entanto, encontrar até agora notícia de qual o fim que estas terras tiveram após a morte do chanceler Julião, em 1215.
O foral manuelino de vila nova de Ceira
Em 1514, Ceira recebeu de foral D. Manuel.
Na época em que o foral foi outorgado, os lugares da vila possuíam, além da produção agrícola, o valor dos moinhos e pisões que, movidos pela força das águas do rio Ceira, serviriam as populações locais e dos arredores. Além disso, aqui ficava um importante porto fluvial. Numa época em que as estradas não passavam de caminhos e carreiros, o transporte fluvial era o mais fácil e eficaz. Quer mercadorias, quer pessoas, tudo se transportava pelo rio. E nesta confluência de "estradas" fluviais - o Mondego, o Ceira e o Dueça - um porto tinha um valor acrescido.
Em 1643, o Processo de vistoria que, a requerimento do juiz de Ceira, se fez a uns baldios no dito lugar, prova que a povoação era ainda um concelho, visto que ainda tinha juiz.
Entre 1827 e 1836 mantém-se a categoria administrativa, comprovada pelo Livro de Coimas do Concelho de Ceira, um registo de coimas por transgressões de posturas municipais que está interrompido após o último auto de coima registado a 7 de Fevereiro de 1836.
No entanto, no Termo de recenseamento eleitoral do mesmo ano de 1836, Ceira consta já como freguesia do concelho de Coimbra. Embora não tenha sido até agora possível encontrar elementos precisos sobre esta modificação, é de notar que ela é contemporânea das reformas administrativas de Passos Manuel, no início do reinado de Dª. Maria II.
· ·
Ceira no séc. XX
Nos finais do séc. XIX, as estradas macadamizadas começaram a reduzir a importância do transporte fluvial. A produção industrial de tecidos tinha tornado obsoletos os pisões, que desapareceram sem deixar memória nas gentes que hoje ali vivem. A industrialização também veio a diminuir o trabalho dos moinhos. Apenas a agricultura familiar continuava a ser uma riqueza apreciável. Talvez tenha sido então que os serviços prestados aos habitantes da cidade de Coimbra se tornaram um dos principais meios de subsistência da população de Ceira.
No início do séc. XX, na obra Notas de Arqueologia e Etnografia do Concelho de Coimbra, a respeito de Ceira, Vergílio Correia refere a ausência de monumentos capazes de interessar os estudiosos. No entanto sublinha o pitoresco do local, descrevendo as inundações que transformam o vale num lago, os pinhais que formam "uma selva escura e densa" nas encostas da Joariça ou Aljuriça, as oliveiras que "laivam de cinzento o vermelho dos barros".
Em meados do séc. XX, a maior parte da população da freguesia de Ceira vivia do cultivo de leiras de terra, feito em grande parte pelas mulheres, já que a maior parte dos homens trabalhava na cidade em diversos ofícios.
Na mesma época, as mulheres ocupavam-se também da lavagem da roupa das senhoras de Coimbra, tarefa em que se tornaram famosas usando a sua antiga sabedoria popular.
A roupa era recolhida nas casas da cidade à Segunda-feira e trazida em grandes trouxas sobre um carro de bois. No dia seguinte, havia que fazer a barrela, tarefa que exigia uma noite passada ali, à beira-rio fizesse o tempo que fizesse. Não havia sujidade que resistisse à acção das cinzas e da água quente.
Durante o resto da semana, era preciso secar dezenas e dezenas de lençóis, toalhas, fronhas, guardanapos... Se o tempo fazia negaças, era um corrilório para os pinhais, onde faziam o estendal, ora a pôr, ora a tirar a roupa. E, na Segunda-feira seguinte, lá partiam de novo para Coimbra, a levar a roupa branquinha e a trazer novas trouxas de roupa suja.
As mulheres de Ceira ainda arranjavam tempo para ir à cidade e andar a vender, de casa em casa, os raminhos de carqueja que então era usada para acender os fogões das cozinhas.
Mas os tempos mudaram e as máquinas de lavar e os novos fogões fizeram desaparecer estes trabalhos, que hoje não são mais do que uma recordação.
Ceira foi elevada a Vila no mês de Junho de 1997.
Hoje, é povoada por pessoas que trabalham essencialmente em Coimbra, no comércio, na indústria e em serviços. São também célebres os seus viveiros de árvores de fruto.
Com o crescimento da cidade de Coimbra, tornou-se numa povoação de subúrbio. No entanto procura manter uma vida cultural própria através de vários grupos, tais como.
www.eb23-ceira.rcts.pt
# posted by carlos : 11.11.03
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Vale do Ceira
Vale do rio Ceira visto por Eugénio de Andrade.
"Pelo vale, realmente fértil, corre o Ceira: uma faixinha de água, liricamente debruada de choupos e amieiros, que não tarda a entrar no Mondego. Ao fundo, o monte do Senhor da Serra e, mais longe, entre lilás e violeta, a serra da Lousã. Duas vezes por dia, no meio daquele verde todo, dando serventia a duas ou três casas que por ali havia, passava um comboiinho, que se desfazia ao apitar. Os terraços da casa precipitavam-se no abismo quase a prumo, e entre as fragas rompia um vegetação áspera, em tufos. Ao entardecer, avistava-se às vezes, a sair de uma loca, uma raposa, que logo desaparecia entre as giestas e as urzes; e os milhafres pairavam sereninhos. Por detrás da casa, os pinheiros, os eucaliptos e as acácias eram um imenso leque aberto. E à roda, um silêncio maior que o mundo.
Penso em Coimbra e é este o rumor que me chega: um amanhecer de pássaros, o coaxar das rãs pela noite fora".
Eugénio de Andrade, «Poesia e Prosa».
# posted by carlos : 11.11.03
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Segunda-feira, Novembro 10, 2003
Um mundo em transformação
Um mundo industrial em transformação
(...) Podemos afirmar que vivemos num mundo caracterizado pela galopante complexidade, interdependência e inconstância dos processos, mas crescentemente homogeneizado, económica (e culturalmente!).
Esta mundialização acentuou-se,fundamentalmente pela aceleração das trocas comerciais entre as nações após a assinatura em 1947 do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), pela importância desempenhada pelas comunicações (maior rapidez e menores custos), pelo progresso tecnológico (relacionado com o processo produtivo, a comercialização, a gestão, etc), pela crescente preocupação com as questões do ambiente (preservação, poluição, gestão dos recursos, etc.), que conduziram ao aumento exponencial dos fluxos comerciais e financeiros.
As empresas ultrapassam fronteiras, o investimento directo no estrangeiro cresce rapidamente. A mundialização ainda é mais marcante quando se pensa nos fluxos respeitantes aos serviços, aos dados informáticos, às telecomunicações, entre outros.(...)
(Multinacionais e Pequenas e Médias Empresas na Industrialização de Espaços Periféricos / Um mundo industrial em transformação pág.2 / Rui Gama / Faculdade de Letras, Coimbra,1994)
# posted by carlos : 10.11.03
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Domingo, Novembro 09, 2003
Na manhã daquele dia trágico
Na recordação não teremos vivido em vão.
Em memória de um Grande Amigo: o Luís Castilho.
Carolina e Helena continuam os teus passos.
A estirpe gera a estirpe,
e alcança poderes crescentes;
a espécie gera a espécie
em milhões de anos
Mundos morrem e nascem.
Na alegria de viver, tu, a quem foi concedido
ser uma flor desta primavera,
goza um dia em honra do eterno
na condição de homem;
oferece o teu óbolo
até ao surgir do eterno,
respira num único e
imperceptível fôlego
o dia eterno!
(Salmo II / Bjornstjerne Bjornson)
# posted by carlos : 9.11.03
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