Embora seja um ato extremamente reducionista tentar definir a obra de um autor através de poucas palavras (como se ele cometesse, invariavelmente, versões de mesmas intenções em toda a sua obra), se não é definidora, ao menos serve como auxílio para compreender um tanto sobre os romances de Roth as três palavras que o romancista John Updike utilizou sobre seu trabalho: literatura, ereção e Israel. Auxilia por que dá conta das discussões sobre literatura que estão sempre norteando os personagens-narradores (em especial o alter ego de Roth, Nathan Zuckermann), escritores, professores, grandes leitores, e suas preocupações ou obsessões de ordem sexual, e, lógico, a mais identificadora característica de Philip Roth, as discussões sobre judaísmo em que seus personagens estão sempre envolvidos – que tanto podem assumir características de auto-ironia, como pode passar por zombaria dos costumes e tradições israelitas (recebendo até mesmo acusações de fomentação de preconceito contra o povo judeu) como pode comportar quase ensaios sobre judaísmo e Israel, tão complexos que provavelmente só um estudioso do assunto poderia elaborar sínteses que possam ir além da superfície e do risco de se enganar sobre as reais intenções de Roth. Um exemplo notório desta última forma da questão do judaísmo se sobressair no texto de Philip Roth é o romance de 1993, Operação Shylock, um delírio ensandecido em que o próprio Roth é narrador mas também personagem, envolvido com um trapaceiro que se faz passar por Philip Roth em Israel e prega a Nova Diáspora como única saída para o impasse do Oriente Médio. Se é uma discussão séria ou piada nonsense de Roth, isto é algo que seu sarcasmo e humor corrosivo não tem nenhuma preocupação de nos tornar claro. O que importa é o grande achado literário que acabou sendo para a sua carreira seu constante tom entre humorístico e amargurado e a falta de auto-piedade judaica que, ainda que traga emanações por vezes violentas, capazes de evocar para alguns um ressentimento beirando o preconceito, na verdade se traduz somente como um reflexo inteligente deste grande autor sempre em contínua auto-avaliação.
Alessandro Garcia - Philip Roth: afrontando a América.
Uma análise de “Lição de Anatomia”
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