Em 1934, Bertolt Brecht escreveu sobre o carácter nada inocente das nossas escolhas conceituais. Mais de 70 anos depois, a reflexão permanece actual. Nas últimas semanas, foram divulgados novos estudos que advertem sobre o colapso ambiental e social no planeta. Que nome devemos dar a esse quadro?
«Na nossa época, aquele que em vez de ‘povo’, diz ‘população’, e em lugar de ‘terra’, fala de ‘latifúndio’, evita já muitas mentiras, limpando as palavras da sua magia de pacotilha. A palavra ‘povo’ exprime uma certa unidade e sugere interesses comuns; a ‘população’ de um território tem interesses diferentes e opostos. Da mesma forma, aquele que fala em ‘terra’ e evoca a visão pastoral e o perfume dos campos favorece as mentiras dos poderosos, porque não fala do preço do trabalho e das sementes, nem no lucro que vai parar aos bolsos dos ricaços das cidades e não aos dos camponeses que se matam a tornar fértil o ‘paraíso’. ‘Latifúndio’ é a expressão justa: torna a aldrabice menos fácil. Nos lugares onde reina a opressão, deve-se escolher, em vez de ‘disciplina’, a palavra ‘obediência’, já que mesmo sem amos e chefes a disciplina é possível, e caracteriza‑se portanto por algo de mais nobre que a obediência. Do mesmo modo, ‘dignidade humana’ vale mais do que ‘honra’: com a primeira expressão o indivíduo não desaparece tão facilmente do campo visual; por outro lado, conhece-se de ginjeira o género de canalha que costuma apresentar-se para defender a honra de um povo, e com que prodigalidade os gordos desonrados distribuem ‘honrarias’ pelos famélicos que os engordam.»
Marco Aurélio Weissheimer , "Os nomes da barbárie"
Informação Alternativa
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